sábado, 22 de dezembro de 2007

A palavra vadia

Por Airton Monte
jornal O Povo

Não importa o que você pensa, diga ou faça, a vida continua a rodar em cima de trilhos incertos, seguindo rotas inesperadas. Sim, claro que você tem todo o sagrado direito de espernear, esbravejar, rebelar-se contra as armadilhas que o destino lhe prepara, emboscado nas esquinas do tempo e você está mais do que cansado de saber que o tempo sempre urge e regorgita seus entulhos. Bem que o poeta Homero acreditava piamente no que dizia quando dizia: "que é somente em mim que ocorre o bem e o mal".

Por vezes, penso que nada do que escrevo carece de alguma importância e que nem literatura verdadeiramente é. Meus romances, minhas novelas, meus contos, meus poemas, minhas crônicas me parecem de uma banalidade, de uma vulgaridade ímpares e que, para ser mais realista, eu bem que os poderia ter escrito em rolos de papel higiênico. Pelo menos, isso lhes daria a perfeita dimensão de que são dotados e o real porte de meu talento como escritor. Sim, eu devo, por uma questão de honestidade, ser realista, pragmático ao menos uma vez na vida.

De nada vai me adiantar por panos mornos nessa questão literária, posto que literatura trata-se de uma coisa muito séria, não é negócio para amadores. Literatura é destinada somente aos grandes gênios incompreendidos feito o Carlos Emílio Correia Lima e o Gilmar de Carvalho. Eu devo, acima de tudo, inclusive do bem e do mal e da minha vaidade pessoal, recolher-me a minha atroz insignificância.

E afinal, para que mentir a esta altura de meu existir, quando estou prestes a dobrar o cabo da boa esperança? Não passo de um mero, de um reles escrevinhador de croniquetas comezinhas, despidas do mais remoto brilho ou fulgor de inteligência. Escrever é coisa muito séria e amadores devem, para o seu próprio bem, passar ao largo desse terrível ofício.

Comungo com a poeta Olga Orozco quando ela fala pela boca de um anjo: "ser poeta é sentir-se incompleto, limitado e prisioneiro neste eu e nesta realidade tangível, frente a um universo desconhecido que nos excede". E eu nunca me senti assim.

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